segunda-feira, maio 12, 2014

palavra truncada


 



Hoje em meio a camisas, camisetas, meias e meiões, e meio corpo debruçado quase dentro da máquina de lavar [meço 1 metro e meio apenas, bem nem tanto assim 1,55], me vieram os pensamentos de supetão: você não escreve mais você mesma...

Entre uma e outra peça pendurada no varal me dei conta que é isso mesmo, não escrevo mais a mim mesma, não o que de fato se atola em burburinhos que era outrora parido em letras e palavras, nem tão sutis e lapidadas como hoje em dia.

Mas por quais motivos se deu que as coisas sejam ainda coisas dentro de mim, mas virem à luz apenas um terço delas ou nem verem a luz do monitor LCD deste laptop? A censura.

A autocensura primeiramente. E depois a censura que deu lugar a essa autocensura. 
Você atualmente graças a todas essas redes sociais não escreve mais para o outro, aqueles outros anônimos, ou nem tanto, mas que lhe liam por ter com você empatias, similaridades, assim que lessem o que eu cuspia, paria em letra não corria o risco de ser um choque, de chocar, mas eis que as redes sociais que hoje aproximam mais céleres que um segundo findado, trouxeram consigo a proximidade quase onisciente e onipresente das relações parentais. 
Então a escrita fica pela metade. Querendo ou não eis a censura que gera a autocensura.

Em sã consciência você jamais escreverá as lacunas perenes emanadas pela sua infância para que sogros, cunhados, irmãos, pais leiam. Aonde já se viu ir rumo a um patíbulo certeiro de livre e espontânea vontade? Em sã consciência ninguém vai.

Ou exporá em forma de poesia subterrânea suas tresloucadas madrugadas rua afora, ou os corredores mil afora dos seus tempos de primeira faculdade. Mesmo que tudo isso seja você. Mesmo que tudo isso possa servir para alguma coisa depois de escrito. Você não escreverá sobre se a presença das redes sociais lhe pesar.
O que vêm a ser engraçado na verdade, pois mediante essas redes se pretende ser mais lido, mais notado, mais visto, porém escrever com suas vísceras, derramar a bile que corrói a alma é outra coisa.

Assim pendurando as vestes da minha cria tornei oficial para mim mesma essa verdade absoluta: eu hoje escrevo parcialmente, uma parcial do que sou, uma metade do que há, aqui dentro.

E confesso me deu vontade de sentar e deixar cair o pranto junto com o chuvisco que começava a se derramar dum céu escuro, quase um roxo cinza zangado, pois terminei sendo o que jamais supus ser, alguém de alguma forma pela metade, numa autoimposição castradora, ceifadora. 

Usar codinomes, avatares é um artifício que se vê em uso exatamente por quem como eu, não pode ser lida na íntegra, mas seria a minha morte súbita se eu usasse esse recurso, pois odeio e sempre odiei codinomes, avatares, meu nome, marca, codinome sempre foi um apenas: Luciana Onofre. E só. E disso não abro mão.

Indo para trás na minha linha do tempo lembrei que a decisão de ter/escrever um blog se deu exatamente quando eu estava gerando minha primeira filha [ mais de 13 anos já passados] , para que ela soubesse quem sou, quem fui, o quê eu era, logo a premissa era me jogar inteira na letra, me verter, me traduzir em  frases, constatações, lembranças, [todas] não apenas as cores pasteis, mas sim meus mergulhos soturnos, abissais, meus relatos sobre por aonde estes pés perambularam, o que estes olhos viram, o que esta boca guarda... Ou seja, tudo é uma contradição, pois decidi escrever para que minha prole me lesse, [eis umas das relações parentais então] mas cá estou me lamentando pelo rumo que minha escrita teve.

Como gerenciar isso? É impossível mutar o olhar alheio, pedir que se desfaça das prenoções, dos julgamentos, pedir que permitam ao outro ser, escrever tal como ele é; sem máscaras. Então o que resta?

Irei dormir com essa questão certamente e certamente acordarei com ela...

Luciana Onofre


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